O desafio de qualificar a classe trabalhadora
Em tempos de agenda política pautada pelo mercado financeiro, nunca se viu uma frase tão atual quanto “a crise da educação no Brasil não é uma crise; é um projeto” – Darcy Ribeiro, antropólogo, educador, escritor e político brasileiro
Quando dirigentes do Sindimovec foram até a Agência do Trabalhador de Campo Largo discutir políticas voltadas à qualificação profissional, surgiu também à necessidade de aprofundar o assunto. Para a entidade que defende os trabalhadores metalúrgicos de Campo Largo, é preciso o envolvimento de todas as partes, desde trabalhadores, empregadores e administração pública, na construção de novas perspectivas educacionais.
Esta entrevista com João Madureira – diretor geral do Instituto Federal do Paraná (Campus Campo Largo), professor da rede federal de educação, há 25 anos; é sobre qualificação profissional da classe trabalhadora
Sobre a profissionalização da classe trabalhadora em Campo Largo, qual o trabalho que o Instituto Federal desenvolve?
João Madureira: Os Institutos Federais e nós, do Instituto de Campo Largo, defendemos uma nova visão de política pública e de qualificação profissional, que se inicia a partir da criação dessas entidades, em 2008. É isso que a gente vem tentando construir e contribuir, aqui na cidade, através da oferta de formação profissional qualificada e integral, para os filhos e filhas da classe trabalhadora. O objetivo é fazer da qualificação profissional um instrumento de emancipação e de empoderamento. Inclusive no sentido de disputar espaço não só profissional, mas como sujeito dessa relação desigual de capital/trabalho. Chamamos essa formação de omnilateral, que garante condições para que o trabalhador se aproprie dos fundamentos, da técnica, do saber, para construir sua autonomia e a sua emancipação.
Com a sua experiência no mundo da educação e do trabalho, como você define o perfil dos atuais profissionais?
JM: Com a criação dos institutos federais e de outras escolas técnicas, que procuraram dar uma nova visão para a educação profissional, pudemos observar que, em relação aos jovens, a gente precisa considerar a transformação do próprio sistema produtivo, ao longo das últimas décadas. As próprias mudanças de alguns paradigmas, na formação, trazem para dentro da escola a necessidade de repensar a formação profissional, no sentido de que ela promova um contato, uma formação, mais consistente desse trabalhador, para que ele dê conta também das novas tecnologias e das transformações tecnológicas.
Como você acha que a reforma trabalhista e a da previdência influenciam na procura por qualificação profissional?
JM: Essas reformas vêm com um discurso da chamada modernidade. “Porque o mundo evoluiu, então nós temos que modernizar as relações de trabalho”. Mas isto é um engodo. Isto é para enganar os trabalhadores, porque essas poucas conquistas, como a CLT, são conquistas que procuram garantir os direitos dos trabalhadores. Num momento em que os direitos dos trabalhadores são obstáculos para a ganância, o aumentar dos lucros e as garantias de manutenção da estrutura hegemônica, todo esse discurso representa uma forma de opressão e de se exploração.
Há uma preocupação, do Instituto, com os impactos que virão com as mudanças nas relações de trabalho?
JM: Há sim. Pois no momento em que se permite a terceirização da atividade fim, que considero a questão mais grave da reforma trabalhista, você está dizendo que não necessariamente eu vou ter que investir num trabalhador. Desfaz-se a perspectiva de carreira, mesmo dentro do setor privado, você constrói uma carreira. E é justamente o oposto do que defendemos, que é uma qualificação onde o trabalhador possa galgar novos postos de trabalho, visando inclusive uma melhoria salaria. Com a terceirização da atividade fim, o trabalhador vai ser obrigado a saber um pouco de tudo – “hoje eu vou ser contratado aqui amanhã vou ser contratado ali”; fará com que surja um impacto na qualificação e formação profissional, o que é um grande perigo.
Por Regis Luís Cardoso (texto e foto).