#Perfil: A história do trabalhador que se apaixonou pelo mountain bike
Rafael Vinícius de Andrade, 28 anos, Operador de Logística na Caterpillar, tinha uma vida sedentária, mas foi só comprar sua primeira bike que tudo mudou! E pra melhor…
Você sabe dizer o que Amsterdã e Campo Largo têm em comum? Talvez alguém tente explicar, mas, na verdade, há uma distância cultural quase que incalculável entre as duas cidades. Porém, pode-se fazer um recorte profundo entre um fenômeno que aconteceu na Holanda e um foco de mudança que acontece na cidade que fica na Região Metropolitana de Curitiba.
Provavelmente poucos conhecem a história de um movimento contracultural holandês chamado “Provos”. Ele existiu na década de 1960 (fundado em 25 de maio de 1965 até 13 de maio de 1967). Esse manifesto revolucionário era abrangente e exigia mudanças estruturais em Amsterdã.
Das diversas facetas do “Provos”, retiro um fragmento que é importante para esta história. Falo do “Plano da Bicicleta Branca”. Um projeto que tinha como objetivo fechar o centro de Amsterdã ao tráfego motorizado. Para isso, era preciso aumentar a demanda de transportes públicos em aproximadamente 40%.
Como alternativa ao aumento da necessidade de transporte gratuito, a proposta do “Provos” era a aquisição, pelo município, de 20 mil bicicletas brancas. Elas seriam de propriedade pública e ficariam disponíveis para qualquer cidadão. Na época, o projeto foi rejeitado pelas autoridades.
Não contentes, os militantes decidiram pintar 50 bicicletas de branco e as deixar nas ruas para uso público. A polícia apreendeu as bikes alegando que havia uma infração municipal na ação do Provos. Em Amsterdã, era proibido deixar bicicletas em espaços públicos sem prendê-las com cadeado.
No final das contas as bikes foram devolvidas aos militantes do “Provos”.
Foi então que eles se superaram.
Em nova ação, os militantes decidiram equipar as bicicletas com cadeados de combinação e colocar a senha pintada na própria bicicleta. A partir daí, qualquer cidadão poderia desprender a bike e usá-la como transporte público.
Rafael Vinícius de Andrade
Quando a história nos mostra esse ‘causo europeu’, pode-se pensar: “nossa, eu não sei o que é mais perigoso: um integrante do “Provos” enfrentar as autoridades holandesas na década de 60 ou um ciclista campolarguense andar de bike na Av. Padre Natal Pigatto, em Campo Largo!”.
E como o Sindimovec já havia feito uma matéria sobre o trabalhador da Caterpillar (CAT) na disputa do Campeonato Metropolitano de Mountain Bike (CMMTB), conversamos com Rafael Vinícius de Andrade, de 28 anos, Operador de Logística, sobre o assunto: bike.
A história dele inicia dois anos atrás, em 2015, quando comprou sua primeira bicicleta. O objeto era usar a bike pra ir trabalhar. “Fui pegando o gosto pelo negócio. No começo peguei uma ‘aro 26’. Depois vi que precisava de uma melhor. Então vendi a primeira e comprei outra. E assim fui melhorando”, explica Rafael.
O trabalhador é natural de Guarapuava, chegou em Campo Largo ainda criança, com toda sua família. Trabalha faz mais de quatro anos na CAT. Sua história se assemelha a diversas biografias. Ele fazia faculdade de Tecnólogo em Logística, na Universidade Tuiuti e teve que trancar os estudos pra continuar a construção da sua casa própria: “a minha intenção é voltar a estudar. Gosto do meu trabalho. Pretendo crescer o máximo possível dentro da fábrica”.
Ei, vamos falar de bike?
Rafael mudou! Passou de uma vida sedentária a fiel competidor de mountain bike. Hoje, fala com naturalidade sobre as melhores opções de aro para uma bike. Mostra, de verdade, paixão sobre assunto: “para mountain bike, o aro 29 ganha em velocidade, rende mais a pedalada e tem buraco que você nem sente; porque o aro é maior e passa mais fácil. Na decida e nas retas também rende mais que o aro 26; já esse, é melhor na subida, é mais leve”. Ele acrescenta ainda que para competir no mountain bike há opções de aros no tamanho 26, 27,5 e 29.
Esse conhecimento sobre bike muito se deve a revolução que Rafael passou nos últimos anos. Não é a toa que hoje participa do Campeonato Metropolitano de Mountain Bike (CMMTB), competição de alto rendimento disputada por atletas de todo Paraná.
Mas tudo começou quando ele adquiriu sua primeira bicicleta. Nessa época, Rafael estava fora de forma. “Eu cheguei a pesar 98 kg. Foi quando comecei a levar a sério a bike. Hoje estou entre 87 e 88 Kg, em pouco menos de dois anos”, explica.
O legal é notar que em pouco tempo o trabalhador passou a participar de outras competições. “No “Desafio Braves”, participei na categoria Open e fiquei em segundo lugar, à frente de outros 12 competidores”, fala orgulhoso. O ‘atleta das pedaladas’ também competiu no “Desafio da Cevada”, em Bateias – Campo Largo, um desafio de 90 km que ele fez em 6 horas, no meio de muita subida, estrada de chão e pedra solta.
Bike como estilo de vida
Mas usar uma bike é algo que vai além das competições. “Às vezes vou ao trabalho de bike, às vezes não. Eu tento ir, mas falta uma ciclovia, que ajudaria bastante, porque em Campo Largo não tem”, conta o trabalhador. Para ele, outra questão fundamental para aumentar ainda mais o uso de bicicletas como meio de locomoção na cidade é a conscientização: “tem bastante motorista que não respeita. Mesmo sendo lei a obrigatoriedade de andar no mínimo 1,5m do ciclista, tem bastante ônibus que passa “lambendo” você. Tem que ficar esperto”.
Rafael chama atenção para a importância da prevenção: “nunca aconteceu acidente comigo na cidade, mas já vi gente se desiquilibrando da bike quando um carro passa muito perto”. Na CAT onde Rafael trabalha tem uma ciclovia e um bicicletário, mas ao sair para as vias municipais é preciso tomar cuidado. “Na frente da Caterpillar, por exemplo, tem bastante gente que anda de bike. Ali seria bacana uma ciclovia”, sugere.
Até porque, o número de usuários de bike aumentou bastante: “às vezes a gente até brinca que bicicleta virou meio que modinha. Muita gente quer comprar. Na verdade, isso é bom, ajuda muito na saúde. Uma pena que a cidade não acompanhou. Cresceu o número de ciclistas, mas não têm lugares seguros pra andar”, aponta o trabalhador.
Um exemplo é a Av. Padre Natal Pigatto. “A rua é bem apertada. Tem que ter atenção total. A gente anda na cidade, mas é mais seguro pedalar na estrada de chão. Aqui (Campo Largo) é meio ‘complicadão’ pra andar”, completa.
“Eu comecei brincando. Mas aí vai pegando o gosto pelo negócio… No Metropolitano, que é uma competição bem puxada, eu ainda não consegui chegar entre os primeiros. Mas estou em busca. É gostoso quando você completa uma prova. É muito gratificante você saber que no meio de diversas pessoas você consegue completar”
Rafael Vinícius de Andrade.
Assessor para assuntos específicos
Além de melhorar a qualidade de vida, ser um adepto das pedaladas elevou Rafael ao status de “conselheiro para assuntos específicos”. O ciclista da CAT já foi procurado pra assessorar um colega de trabalho na compra do equipamento ideal. Rafael dá o recado: “primeiro de tudo a bike tem que ser do tamanho certo pra pessoa. Pra mim, por exemplo, que tenho 1m84, o quadro tem que ser do tamanho 19 ou 20 (pra não ficar pequeno). Tem a altura certa do quadro pra cada pessoa”.
Na verdade, quem não manja do assunto se complica na hora de fazer uma “boa configuração” na bike. “Tem que pegar um freio bom. Tem o freio mecânico e o hidráulico. O mecânico é aquele com o cabo, o hidráulico é só com o óleo; esse é um freio melhor”, analisa Rafael. Ele também não esconde a preocupação com as questões de segurança: “o capacete é o principal, não pode andar sem. Eu já vi muito acidente na minha frente que se não fosse o capacete ia ser mais grave. Ele é importante na competição e fora dela”.
Mensagem de incentivo
Hoje o atleta das duas rodas conseguiu melhorar sua saúde: “sem pedalar eu era sedentário, às vezes ia jogar uma bola, só que era só aquilo, depois não fazia mais nada”. E nessa mudança de vida, nem tudo foi alegria, houve muito tombo também:
“Em Morretes eu caí. Furou um pneu. Eu estava disputando uma posição. Quando estava passando um adversário, acho que o pneu dianteiro pegou numa pedra um pouco antes da ultrapassagem. Quando vi, o pneu deu uma murchada e quando cheguei numa curva fechada, meu pneu descolou do aro e aí fui pro chão”
Rafael Vinícius de Andrade.
De acordo com Rafael, no ciclismo tem o seguinte ditado: “tem os que já caíram e os que vão cair”. Ele explica que a bike mudou sua vida: “eu tenho mais ânimo hoje em dia. Não fico tão preguiçoso. Fico menos estressado”. O trabalhador também vê na bicicleta uma maneira de melhorar o meio ambiente. “Quanto mais gente deixar o carro em casa e andar de bicicleta, até o meio ambiente agradece. Há tanta poluição! E com a bike, fica uma coisa mais sustentável”.
Ao ser questionado sobre “aonde quer chegar” como ciclista, Rafael é objetivo: “quero chegar a ser campeão geral da minha categoria (no Campeonato Metropolitano de Mountain Bike – CMMTB) e fazer um brasileiro de mountain bike”. Segundo o trabalhador, para participar de um campeonato brasileiro, por exemplo, o investimento é alto e foi nessa adversidade financeira que surgiu a ideia de procurar o Sindimovec:
“Eu ia participar do “Desafio da Cevada”, indo pra Bateias (Campo Largo), aí eu lembrei que o Sindicato tinha patrocinado um torneio de futebol. Então pensei: será que eles ajudam na bike? Vou tentar! O não é garantido. Liguei no Sindicato, mostrei que é um jeito de ajudar o trabalhador fora da empresa, aí, no outro dia, já ligaram dizendo que iam me ajudar”.
Recado: “Quem tiver condição de comprar uma bicicleta, compre. Só de passear, sair de casa e dar uma volta no parque, já é gratificante”.
Além das palavras de incentivo para que as pessoas pratiquem atividade física, fica a dica da viabilização de uma ciclovia em Campo Largo. “Acho que daria pra investir numa ciclovia. Ajudaria toda a população. Um pai passear com o filho e com a família, além de tirar um pouco dos carros das ruas, ajuda no bem estar da cidade”, finaliza Rafael Vinícius de Andrade.
*Leia o primeiro #Perfil aqui.
Por Regis Luís Cardoso **(Texto e Foto 01) ***(Simone Seguro / Luiz Lupa).